
Promptable Places: a nova fronteira para cidades e regiões na era da inteligência artificial
EMANNUEL COSTA 04.25
Quantas decisões sobre a experiência urbana são tomadas a partir de uma conversa com a inteligência artificial? Seja para planejar uma viagem, pesquisar um bairro para morar ou pedir recomendações sobre um novo restaurante, as pessoas recorrem — cada vez mais — às IAs generativas: ChatGPT, Copilot, DeepSeek e tantas outras que sugerem, comparam, descrevem e até recomendam “esse” ou “aquele” destino, em questão de segundos.
Mas aqui está o ponto crucial: quando as IAs são perguntadas sobre um lugar, o que elas retornam? Uma resposta precisa, assertiva e nuançada? Ou um retrato genérico, por vezes desatualizado, que perpetua clichês, reforça estereótipos e frequentemente fornece informações erradas?
Se você abrir uma aba nova no navegador e fizer uma consulta agora sobre o seu lugar, meu palpite é que cairá na segunda opção.
Ok, vou ser sincero. Na verdade, não é um palpite. É uma constatação interna do nosso time da Urbanscope, que nos levou a uma conclusão ainda mais importante e urgente para cidades e regiões de todos os tamanhos: a necessidade de se tornarem Promptable Places.
Neste artigo, vamos mostrar o que é essa nova competência e por que ela está se tornando fundamental e urgente na agenda urbana.
O que são “Promptable Places”?
Falamos da urgência, mas o que realmente é um Promptable Place? Em linhas gerais, entendemos que um lugar é “Promptable” ou “promptável” quanto mais ele for capaz de ser compreendido, descrito e representado de maneira fiel por IAs generativas.
Se você fez a consulta ao ChatGPT e ele soube responder a população exata ou citar os 5 principais pontos turísticos da sua cidade, não se empolgue; é o mínimo. Não estamos falando disso.
A virada de chave é bastante simples: se as pessoas quiserem apenas obter a informação de maneira objetiva e passiva, continuarão utilizando o Google e as redes sociais para realizar suas buscas rotineiras de sempre. Contudo, a promessa e a performance das IAs generativas (gostando ou desconfiando delas, o que é um outro debate) estão conduzindo a experiência digital para um novo nível, que conecta a curiosidade do usuário a respostas hiper personalizadas, diálogos abertos e possibilidade de descobertas inesperadas.
O que está em jogo não é mais apenas ter estratégias de promoção digital de um destino através de branded content ou tráfego orgânico e pago, por mais bem definidas que sejam. Estamos falando sobre uma nova possibilidade de comunicar um lugar através do seu pertencimento, história, oportunidades e aspirações.
E se isso parece Black Mirror demais para você, bem, preciso lhe dizer que esse trem já partiu e estamos na era onde a primeira impressão – e, em muitos casos, a decisão final também – sobre inúmeros aspectos da vida cotidiana é influenciada (para dizer o mínimo) pelo “juízo” das máquinas, isto é, pelos algoritmos.
Neste cenário, tornar-se “promptável” não será modismo passageiro, mas a nova fronteira da estratégia de posicionamento dos lugares. Condicionar a geração de respostas sobre um lugar com base em sua essência, identidade cultural e oportunidades únicas — aquilo que chamamos por aqui de singularidade — é garantir que as IAs generativas ajudem a construir e compartilhar uma percepção autêntica sobre a sua cidade ou região.

Por que a “promptabilidade” importa agora?
Se você entendeu o conceito, talvez esteja se perguntando: por que isso deveria ser uma prioridade? Por que essa palavra estranha não é uma moda, mas uma questão urgente?
Vamos aos dados:
- A IA é o novo filtro de confiança em massa: segundo uma pesquisa da Zendesk, 68% dos consumidores globais têm maior probabilidade de interagir e confiar em IAs generativas “humanizadas”. Considerando que a reputação de um lugar pode ser formada ou destruída na velocidade de um prompt, certamente é difícil controlar a primeira impressão, mas é possível influenciar como a IA responde sobre um lugar.
- Narrativas genéricas têm um custo (alto): um estudo da Adobe com 3 mil pessoas revelou que 72% dos entrevistados acreditam que, por mais poderosa que seja, a IA generativa nunca igualará a criatividade humana. Quem usa ferramentas como o ChatGPT sabe: elas repetem padrões de respostas genéricas como ninguém. Ou seja, quanto menos “promptável” o lugar, maior o risco de respostas rasas, mal interpretadas ou cheias de estereótipos. Genericidade gera ruído, e ruído custa caro.
- Nossa tomada de decisão é cada vez mais algorítmica: um levantamento da consultoria Bain & Company apontou que 80% dos usuários de internet já usam textos de IA em pelo menos 40% de suas buscas no Google, o que representa uma queda de 25% no tráfego orgânico. De restaurantes a pontos turísticos, as escolhas e sugestões são moldadas cada vez mais por máquinas, em vez de humanos. Neste caso, convém perguntar: quem está definindo a narrativa do seu lugar hoje, a sua estratégia de posicionamento ou dados aleatórios que a IA encontra na internet?
- O impacto é exponencial e difícil de reverter: o tradicional relatório anual de tendências da Accenture revelou que 62% dos consumidores globais priorizam confiança ao interagir com marcas — justamente no momento onde conteúdos gerados por IA inundam redes e buscas. O problema? Uma visão superficial ou distorcida criada por IA não se limita a uma resposta: ela se multiplica, viraliza e cria uma narrativa negativa que pode ser impossível de corrigir. Quando a autenticidade é questionada, remediar o estrago talvez não seja uma opção disponível.

Os cinco pilares de um promptable place
A promptabilidade é crucial. Mas como, na prática, um lugar se torna mais “perguntável” de forma autêntica pela IA? Embora não exista fórmula mágica, identificamos cinco pilares fundamentais que sustentam essa capacidade:
- Posicionamento de marca-lugar: quem é você na fila do pão? Qual é a singularidade do seu lugar? Por que ele é único no mundo? Isso precisa estar claro, bem definido e, acima de tudo, acessível. Não adianta a sua história ser incrível se ela está guardada em documentos arquivados ou, pior, é compartilhada entre poucos e não é apropriada por todos. A narrativa local precisa ser viva, fácil de encontrar e contada de forma que tanto humanos quanto algoritmos consigam entender. Sem uma estratégia de posicionamento à prova de futuro, as partes não se conectam.
- A informação é rainha, mas precisa ser confiável e processável: IAs generativas como o ChatGPT se alimentam de dados abertos e disponíveis publicamente. Se os dados sobre o seu lugar são desatualizados, incompletos, escondidos em PDFs não pesquisáveis ou simplesmente incorretos, adivinha o que a IA vai retornar para um potencial visitante, morador ou investidor? A qualidade e a acessibilidade da informação são a espinha dorsal da promptabilidade.
- As versões da sua história precisam “bater”: pouco adianta ter um novo logotipo, ou comunicação alinhada nas redes sociais se as avaliações no Trip Advisor, os posts de influenciadores, as notícias na mídia local e os comentários de moradores e turistas no Instagram contam histórias diferentes. A IA cruza informações de múltiplas fontes que, se forem inconsistentes, geram confusão na interpretação da máquina e diluem a mensagem. O posicionamento de marca-lugar precisa ecoar em todos os canais onde ele é requerido.
- Ser promptável não é ser simplista: Lugares são complexos e cheios de camadas, histórias, interesses e sentimentos. Mas a IA, por padrão, sempre tende ao genérico. O desafio está em “ensinar” ou “mostrar” a singularidade. Quanto mais camadas de senso de pertencimento você fornecer, menor será a chance de uma resposta superficial.
- Lugares mudam o tempo todo (e a IA precisa saber disso): sua cidade inaugurou um novo parque tecnológico? Recebeu uma chancela da UNESCO? As métricas de atração de talento estão em alta? Conte isso para o mundo, exaustivamente. Ser promptável também significa refletir essa evolução e não deixar a IA ficar presa a uma foto antiga do lugar.
Importante: não se trata de um checklist, mas de áreas de atuação estratégica que exigem atenção contínua. Assim como a gestão de marca-lugar, a promptabilidade é um processo ininterrupto, não um projeto com data para acabar.
Seu lugar está pronto para ser promptável?
A forma como descobrimos, percebemos e escolhemos lugares está sendo radicalmente transformada pela inteligência artificial. Não é mais uma questão de “se”, nem de “quando”, mas de “como” a IA se tornará a principal porta de entrada para a experiência urbana. Ignorar essa realidade não é uma opção.
Cidades, regiões e destinos que entenderem e agirem agora para garantir que sua identidade e oportunidades sejam fielmente representadas pelos algoritmos sairão na frente da construção ativa de sua reputação e relevância na nova economia da atenção digital, atraindo investimentos, talentos e visitantes alinhados com sua verdadeira essência.
Tornar-se um Promptable Place exige visão de futuro, estratégia adaptativa e olhar atento aos cinco pilares. De narrativas claras a dados confiáveis, escaláveis e atualizáveis, o trabalho é contínuo – mas a recompensa também.
O futuro da percepção e procura da sua cidade está sendo escrito agora, por prompts e respostas de IAs generativas. Mas o seu lugar está preparado para ser não apenas encontrado, como verdadeiramente compreendido e representado pela inteligência artificial?