
O Futuro do Mercado Imobiliário
CAIO ESTEVES 06.25
Quando comecei a trabalhar com as questões urbanas, meu foco recaia nas cidades, regiões e países, objeto de estudo do dito place branding tradicional. Minha primeira consultoria, não por acaso também a primeira 100% dedicada as marcas-lugar do país tinha esse recorte.
Foi numa aula do curso de cidades inteligentes onde compartilhava minha experiência sobre o assunto que as coisas mudaram. O curso naquele formato não existe mais, talvez pelo fato de logo no primeiro final de semana de aula (as aulas eram aos sábados e domingos, de manhã e de tarde) os professores eram, na sequência, meu amigo Caio Vassão e eu, que então falavam tudo exatamente oposto ao que o senso comum imaginava sobre cidades inteligentes.
O fato é que na minha aula, um domingão paulistano típico, estava na primeira fila, com seu colete Michelin tradicional, meu hoje amigo, Paulo Toledo, que certamente todo mundo do mercado imobiliário que eventualmente venha a ler esse texto conhece. Depois de umas perguntas cabeludas, típicas dos alunos folgados que querem testar o professor, ele se acalmou e talvez tenha ali concluído que o dia poderia valer a pena. No final da aula nos falamos e na semana seguinte já estávamos viajando juntos pelo Nordeste, numa mistura de um MBA impagável sobre o mercado imobiliário e um teste para ver se eu aguentava o tranco de acompanhar seu ritmo frenético de trabalho. Nesse momento tinha sido oficialmente dragado para o mercado imobiliário.
Sempre tive a iniciativa privada como uma possibilidade de atuação, bairros planejados, grandes empreendimentos tinham, a meu ver, a necessidade de se relacionar com a identidade do lugar ao invés de preocupar-se exclusivamente com o lugar do ponto de vista geográfico. Essa nova abordagem inclusive seria capaz de qualificar lugares até então pouco sedutores ao mercado. Meu primeiro projeto de place branding propriamente dito foi um enorme bairro, junto a iniciativa privada.
A fome de lenhador por novos termos (e a incapacidade de implantá-los)
Mas ser o “amigo esquisito do Paulo” me deu oportunidade de conhecer players e projetos importantíssimos do mercado brasileiro e o prazer de trabalhar em grande parte deles. Uma das minhas primeiras conclusões, não antes de algumas bolas fora que hoje são piadas internas, é que o mercado imobiliário é, na mesma medida, um lugar absolutamente avesso a inovação e ávido por novidades. O que pode parecer um contrassenso a princípio é facilmente explicado. É justamente essa aversão a inovação que faz com que ele, o mercado, busque sempre a última moda, as tendências (como muitas vezes gostam de chamar erroneamente, o que no ramo chamamos de “fad” ou na melhor tradução, “modismo”). Eu mesmo senti isso na pele, tanto com o place branding quanto com o placemaking, ambos devorados, mastigados e cuspidos numa velocidade impressionante, sem grandes transformações ou impactos, simplesmente porque eram uma “novidade”, muito mais interessante enquanto discurso do que enquanto implantação (afinal implantar da um trabalho considerável, já falar…)
Não foi surpresa nenhuma ver que a discussão sobre os futuros também se tornou alvo do enorme apetite do mercado. Me deparei com termos bizarros, como “futurologismo”, além do próprio uso modal do termo futuro.
Sempre tentamos, e sempre falhamos miseravelmente
Desde sempre tentamos prever o que nos aguarda adiante, desde o oráculo de Delphos, na antiguidade, passando por cartomantes, búzios, bolas de cristal, polvos adivinhos (abração para o polvo Paul) até chegarmos na inteligência artificial. O fato é que, infelizmente, nunca tivemos sucesso (me desculpe os adeptos das práticas ocultas), ou pelo menos um sucesso concreto e verificável.
Demorei um bom tempo até me entender, e aceitar, de fato como um futurista (estratégico), precisei estudar muito, escrever vários artigos, desenvolver projetos, ser colunista do que considero maior hub de futuros do país, e até escrever um livro para fazer as pazes com o termo, e principalmente, ter a sorte da companhia de grandes nomes do futurismo do Brasil nessa jornada e, claro, a validação deles com um igual.
Uso esse artigo para compartilhar alguns aprendizados desse meu último livro e dos últimos projetos, na esperança de ajudar um mercado tão tradicional quanto o imobiliário na compreensão de algo profundamente importante, algo que não pode ser levado como modismo, “os futuros”.
Sempre plural, por mais contraintuitivo que pareça.
O ponto central da discussão do futuro é que ele é plural e imprevisível por natureza, logo, vocês já entenderam o clickbait no título. Não existe UM futuro para o mercado imobiliário, porque o futuro simplesmente, por não existir ainda, não é singular e falar dele no singular é, necessariamente, falar do presente. Os futuros podem e devem ser explorados, imaginados, criados, mas nunca previstos. A esse tipo de prática/ falácia, usando o futuro como um verniz ou uma maquiagem para velhos hábitos e métodos, damos o nome de futurewashing, aquela camada do discurso para parecer contemporâneo e inovador sem se ter ideia do que isso representa ou implica.
A abordagem dos futuros é uma forma de anteciparmos oportunidades e nos prepararmos para incertezas e criarmos um sistema que chamo de “lugares à prova de futuro”, não porque sejam herméticos e imutáveis, mas justamente pelo contrário, por estarem preparados para as mudanças (de contexto, de comportamento…).
Explorar os futuros é trabalhar num leque de possibilidades que orientam decisões estratégicas do presente.
Como um empreendimento imobiliário que demorará, muitas vezes, cinco anos para ser lançado e dez ou quinze anos para tornar-se maduro pode ser baseado, unicamente, em pesquisas de hoje com dados de ontem? Será que ainda não aprendemos que o mundo muda velozmente ao nosso redor?
Estamos projetando para o amanhã ou reproduzindo nossas “certezas” de hoje? Explorar os futuros não é sobre prevê-los, é sobre: largarmos a ilusão confortável da previsibilidade.
Quanto ao mercado imobiliário, lanço a pergunta: ele está preparado para abordar os futuros com seriedade ou vai tratá-los como o modismo da vez? Você tem segurança na sua certeza sobre o futuro? Seu empreendimento está preparado para ser future-proof?